A criminalização do não pagamento de tributos sem a devida comprovação de dolo específico tem gerado preocupações no meio empresarial. O Direito Penal Tributário, concebido para punir fraudes fiscais efetivas, vem sendo indevidamente empregado como mecanismo coercitivo de arrecadação, comprometendo a segurança jurídica e a estabilidade das atividades empresariais.

A sonegação fiscal, prevista no artigo 1º da Lei nº 8.137/1990, ocorre quando há fraude na apuração do tributo, mediante omissão de receitas, falsificação de documentos fiscais ou outros artifícios para reduzir ou suprimir a obrigação tributária. Esse delito exige a presença de dolo específico, ou seja, a intenção deliberada de fraudar o Fisco.

Por outro lado, a apropriação indébita tributária, tipificada no artigo 2º, II, da mesma norma, caracteriza-se pela retenção e não repasse ao Fisco de tributos arrecadados do contribuinte, como o ICMS-ST ou as contribuições previdenciárias retidas dos empregados. Esse crime independe da existência de fraude documental, bastando a retenção do valor devido. O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do HC 163.334/SC, fixou o entendimento de que o não recolhimento reiterado de ICMS próprio pode configurar crime, desde que demonstrado o dolo de apropriação, não se confundindo com a mera inadimplência.

Essa distinção é fundamental para evitar interpretações abusivas. A inadimplência tributária deve ser tratada na esfera administrativa ou por meio de execução fiscal, não podendo ser confundida com crime. O Superior Tribunal de Justiça reforçou que a reincidência no não pagamento do tributo, isoladamente, não configura crime, exigindo-se a demonstração inequívoca da intenção de apropriação indevida.

O STF estabeleceu critérios objetivos para diferenciar inadimplência de crime tributário, considerando elementos como inadimplemento prolongado e intencional, uso de artifícios para ocultação patrimonial, impedimento da fiscalização e operações fraudulentas. A ausência desses elementos impede a configuração de crime, devendo a cobrança do tributo seguir o rito previsto na Constituição e no Código Tributário Nacional (art. 185).

A utilização do Direito Penal como meio de coerção para pagamento de tributos viola princípios fundamentais, como a reserva legal, a proporcionalidade e a intervenção mínima. O Direito Penal deve ser ultima ratio, aplicável apenas em hipóteses excepcionais, quando outras medidas não forem eficazes para a tutela do bem jurídico protegido.

O empresariado não pode ser penalizado pela instabilidade econômica e burocrática do país. A repressão penal deve ser direcionada a fraudes reais e não à criminalização indiscriminada de contribuintes em dificuldades financeiras. O respeito à segurança jurídica e à legalidade é essencial para um ambiente de negócios saudável, garantindo previsibilidade e estabilidade para o desenvolvimento econômico do País.