Certa vez, fui a uma palestra cujo tema era marketing. Neste evento, o palestrante pediu que todos se levantassem e trocassem de lugar. A grande maioria das pessoas detestou isso, inclusive eu, que já tinha organizado meu lugar, pegado meu café e estava bem confortável só esperando ele falar.
Depois que todos se sentaram novamente, em seus novos lugares, mas com uma insatisfação bem aparente, o palestrante informou que aquela atitude era uma preparação para a fala dele, que tiraria todos ali da zona de conforto.
Agora, você deve estar se perguntando o motivo de eu ter te contado essa história, mas ela é simples e possui muita relação com a reforma tributária, pois é isso que ela fará com todas as empresas, empresários, contadores e demais profissionais da área fiscal, tributária e contábil. A reforma tributária certamente tirará todos nós da zona de conforto.
Hoje, uma empresa apura seus tributos indiretos com uma sistemática conhecida. Embora a apuração do ICMS seja bem complexa e demande muitos cuidados, ela já é conhecida e faz parte do dia a dia dos contribuintes no Brasil.
No entanto, com o IBS, teremos uma nova forma de apurar esse tributo, além das possíveis alterações relacionadas à entrega das obrigações acessórias, o que exigirá muita força de vontade e aprendizado das pessoas que atuam na área.
O IBS, que substituirá o ICMS e o ISS, será um tributo cobrado pelos estados e pelos municípios, através do comitê gestor do IBS, o que já mudará uma das principais regras do ICMS e do ISS, onde cada estado ou município administra sua arrecadação.
O comitê gestor do IBS será o responsável por administrar esse tributo, sendo que o contribuinte deverá observar as regras desse órgão para recolher o IBS, além das normas estaduais e municipais.
Essa pequena mudança (nem tão pequena assim) já afetará e muito a vida das empresas, que hoje estão acostumadas a analisar as normas estaduais e buscar o melhor estado para executar suas atividades.
Com isso, as empresas precisam considerar essas modificações nas suas rotinas desde já, porque, para receber essa nova forma de calcular o IBS, a apuração do ICMS (e do ISS) deve estar redondinha, ou seja, o contribuinte não pode ter dúvida sobre esses impostos, especialmente sobre o crédito que o ICMS gera para a empresa.
Muitos contribuintes não levam em consideração que precisam se adequar às normas atuais para cumprir as novas, mas recentemente a própria Receita Federal já se manifestou sobre a tecnologia envolvida nas novas obrigações acessórias que estão por vir.
O IBS será cobrado com uma alíquota bem pequena no início, 0,1%, o que pode parecer pouco perto das alíquotas praticadas hoje para o ICMS e o ISS (19% em média). Porém, o grande problema (o que tirará de fato as pessoas da zona de conforto) está nas obrigações acessórias que serão implementadas para a cobrança do IBS em conjunto com a CBS e dos demais tributos vigentes.
Assim, muitas vezes a dificuldade do contribuinte não é o pagamento do tributo em si, mas o custo e as dificuldades que envolvem o cumprimento das obrigações acessórias, pois pagar, mas pagar errado ou pagar mais do que o devido, gera muita dor de cabeça para a empresa. Se as obrigações acessórias não forem entregues corretamente, certamente haverá erros nos recolhimentos dos impostos.
A reforma tributária reduzirá (e muito) algumas complexidades que temos hoje, como por exemplo a extinção do ICMS ST (exceto nos casos dos combustíveis, onde será permitida uma única cobrança por toda a cadeia) e a cobrança do ISS e do ICMS em um único tributo – IBS, bem como a concentração da administração desse tributo por um órgão, o que facilitará algumas questões relacionadas ao pagamento para o estado competente, bem como a desoneração da exportação, que hoje é dificultada.
Todavia, para que ela funcione adequadamente, os próprios contribuintes precisam organizar suas questões financeiras e compreender que apenas assim poderão alcançar os resultados desejados, iniciando o trabalho desde já, com planejamento e atenção aos detalhes.
Teremos muitas mudanças com a implementação do IBS, as quais detalharei nos artigos seguintes, especialmente sobre a retirada dos incentivos fiscais do ICMS e a concessão de regimes beneficiados para a CBS e o IBS, pois isso poderá impactar e muito alguns setores, especialmente o industrial. Por isso, é muito importante que as empresas conheçam o cenário atual do seu negócio, para quando chegar esse novo sistema, ela consiga fazer uma mudança adequada, sem precisar correr.
Ademais, extraoficialmente, alguns congressistas se manifestaram pela antecipação da cobrança do IBS, de 2026 para 2025, o que sacudiria o mundo tributário bem antes, fazendo com que muitas pessoas “levantassem dos seus lugares” com mais agilidade, consequentemente, com mais tumulto e agitação, o que pode ser prejudicial para as empresas, pois isso afetaria todos os departamentos, mas especificamente no lucro, com maiores despesas para cumprimento de obrigações acessórias e treinamento de equipe.
Sendo assim, o ideal, para qualquer empresa, é iniciar desde já o mapeamento de suas operações, considerando o cenário atual e as mudanças que surgirão nos próximos anos, calculando o quanto isso afetará o custo da atividade, o preço de venda da mercadoria e da prestação de serviço e o lucro (que é o objetivo de qualquer negócio).
Bruna Kanning – Consultora e Advogada Tributarista com mais de 3 anos de experiência. Especialista em direito tributário, com foco em planejamento tributário e defesas administrativas.
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