Senadores e deputados aprovaram nesta terça-feira (16), em comissão mista, a medida provisória (MP) 1.202/2024, que limita a compensação tributária para créditos oriundos de decisões judiciais transitadas em julgado. O projeto de conversão originado pela medida segue para a votação da Câmara dos Deputados. Se aprovado, ainda precisará passar pelo Senado. O prazo para a votação vai até 31 de maio.

A MP, editada em dezembro de 2023 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tratava do fim da desoneração da folha para 17 setores da economia e para prefeituras. Esses e outros itens acabaram sendo excluídos do texto e estão sendo tratados em projetos de lei. A parte restante da MP, que permanecia em discussão, tratava de dois pontos: a limitação da compensação de créditos tributários e do fim do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), criado para amenizar a crise deixada pela pandemia.

Após um acordo entre governo e oposição, o relator retirou do texto a parte sobre o Perse. O tema já está em um novo projeto de lei em análise na Câmara dos Deputados, em regime de urgência. Além de restringir o programa de 44 para 12 atividades econômicas, o PL 1.026/24 também estabelece reoneração gradativa dos tributos até zerar os benefícios em 2027 para todos os setores.

— Esta relatoria vai acatar a vontade da maioria dos membros desta comissão e nós vamos retirar a revogação do Perse desta medida provisória, que tratará tão somente do parcelamento da compensação tributária e tratará sobre a regulamentação desse parcelamento a ser feita pela Receita Federal — informou o relator, deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA).

Compensação

A parte restante da medida, que trata da compensação tributária, foi mantida exatamente como enviado pelo Executivo. A limitação da compensação de créditos tributários é tida pelo governo como uma forma de aumentar a previsibilidade das receitas da União. A regra afeta contribuintes que, por decisão judicial definitiva, têm direito a receber valores cobrados indevidamente pela União e querem optar por compensar esses valores com débitos tributários futuros.

Pelo texto, essas compensações terão de observar o limite previsto em ato do Ministério da Fazenda. Os limites valem apenas para créditos maiores, acima de R$ 10 milhões. A portaria com esses limites para a compensação foi editada em janeiro, poucos dias após a MP, com os seguintes valores em créditos e prazos mínimos para a compensação:

  •  R$ 10 milhões a R$ 99 milhões: 12 meses
  •  R$ 100 milhões a R$ 199 milhões: 20 meses
  •  R$ 200 milhões a R$ 299 milhões: 30 meses
  •  R$ 300 milhões a 399 milhões: 40 meses
  •  R$ 400 milhões a R$ 499 milhões: 50 meses
  •  Mais de R$ 500 milhões: 60 meses

Para o relator, o parcelamento não é apenas uma vontade do Estado, mas um dever. Ele explicou que, da maneira como as compensações estão sendo feitas, não há previsibilidade, o que gera dificuldade para que o governo cumpra o Orçamento aprovado pelo Congresso. O deputado esclareceu, ainda, que as empresas que não desejarem parcelar a compensação podem inscrever a dívida como precatório e receber de uma vez no futuro.

— A estimativa do ano passado é de que foram compensados R$ 60 bilhões, isso sem estar previsto no Orçamento, o que gerava uma dificuldade para fechar as contas públicas. A previsão para esse ano era de R$ 70 bilhões a serem compensados. Metade disso, R$  35 bilhões, serão compensados em uma única parcela porque são os pequenos contribuintes, aqueles com até R$ 10 milhões de reais. Para o pequeno contribuinte, a compensação é integral — lembrou.

Acordo

Durante a discussão da MP, senadores governistas e da oposição concordaram com os termos do novo texto. O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues, ratificou o conteúdo.

Já o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), líder da minoria no Congresso, disse que, apesar de ser difícil confiar no governo, é uma vitória a retirada da parte do Perse da MP. Ele concordou com a aprovação do texto sugerido pelo relator, mas não descartou a possibilidade da apresentação de emendas pela oposição nos plenários da Câmara e o Senado.

— A gente não pode partir do princípio de que só porque são empresas grandes, empresas que têm créditos bilionários a receber, elas têm que ser penalizadas, têm que ser punidas, têm que ter um tratamento diferenciado em relação às demais empresas. São exatamente esses grandes conglomerados de empresas que geram muitos empregos — alertou.

Audiência

Pela manhã, a comissão, presidida pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE), já havia se reunido para discutir, em audiência pública, as regras de parcelamento para as compensações tributárias. O secretário especial da Receita Federal do Brasil, Robinson Sakiyama Barreirinhas, ressaltou que o texto restante na MP não é uma medida arrecadatória, mas sim de organização das contas públicas. Ele lembrou que a Constituição prevê os pagamentos por meio de precatórios no ano seguinte justamente para garantir essa previsibilidade.

— O particular não pode pedir penhora de bens, penhora de contas bancárias, exatamente para não prejudicar a previsibilidade da execução orçamentária. A Constituição diz que a execução contra o poder público é diferente de uma execução contra particular. No caso do poder público, ele tem a prerrogativa de garantir o interesse coletivo da previsibilidade orçamentária — argumentou.

Ele afirmou que o atraso que vinha ocorrendo no pagamento de precatórios em anos passados fez com que muitas empresas recorressem ao mecanismo da compensação, o que culminou com R$ 60 bilhões que deixaram de ser recebidos em 2023.  O secretário garantiu que a situação já foi regularizada pelo governo, o que torna confortável para as empresas voltar a receber por esse meio.

Representantes das empresas no entanto, argumentaram que os créditos resultam de tributos cobrados de maneira irregular pelo governo e também questionaram o fato de o tema ser tratado em medida provisória e não em projeto de lei.

 — A primeira reflexão que nós devemos fazer aqui é essa matéria veio regulada por medida provisória. Não é a primeira e talvez não vá ser a última matéria de direito tributário chegando a esse Congresso via medida provisória, e fica a pergunta: há relevância e urgência na matéria das compensações tributárias para isso ser apresentado via MP? Respondo aos senhores:  no meu entender, não há — disse o consultor tributário Carlos Alexandre Tortato, integrante  do Conselho de Assuntos Tributários da Federação das Indústrias do Estado do Paraná.

O presidente executivo da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Pablo Cesário, afirmou que a compensação tributária por questões judiciais é um dos resultados maléficos de um sistema tributário ruim e de uma relação assimétrica, que já é desfavorável para as empresas, porque além da demora que já existe no processo, algumas delas terão de esperar cinco anos para receber o que lhes era de direito.

— Equivale a um empréstimo compulsório. Veja só: nós trabalhamos, produzimos um resultado, disputamos 18 anos no Judiciário e no administrativo e agora dizem: “Você tem que que esperar mais cinco anos para receber o dinheiro que é seu, que você vai gerar emprego, investir, empregar outra pessoa ou distribuir para o seu sócio, que trabalhou para aquele resultado” — criticou.

A diretora executiva de Downstream do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) afirmou que a reforma tributária aprovada em 2023 é uma luz no fim do túnel, mas que ainda há consequências do sistema tributário atual e que o acúmulo de créditos é uma delas. Ela lembrou que as empresas também precisam se planejar e que muitas delas contavam com essa compensação, seja para investimentos, seja para lidar com problemas de caixa.

Fonte: Agência Senado

Fonte: Agência Senado